Artes
- TV Donde tem Cultura
- 5 de jun. de 2021
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Crítico de Arte
O crítico de arte atua no grupo social no sentido de executar um estudo pormenorizado e crítico da criação artística em pauta no período em que ele exerce o seu ofício. As pesquisas em torno da produção de artistas mais antigos pertencem a outro universo, o da História da Arte.
Em uma visão panorâmica, os textos que abrangem a arte e seus criadores são enquadrados na esfera da crítica de arte, conforme consta na bibliografia referente a esta categoria do conhecimento. Na acepção literal a crítica das artes visuais está relacionada à ação de determinar o significado preciso das obras criadas pelos artistas e aos juízos de valor expressos sobre as mesmas. Esta prática identifica as criações destes artífices como resultantes de elaborações artísticas.
O crítico dá sentido, emite pareceres, analisa e manifesta seu gosto pelo produto do ofício criador. Normalmente ele opina sobre as obras em importantes canais da mídia ou nos veículos especializados no tema. É muito comum a ligação destas críticas com os grupos social e economicamente mais elevados, particularmente no mundo ocidental. Talvez por esta razão ela seja geralmente rotulada de retrógrada, embora seu papel principal seja o de atuar como um poder revolucionário.
A crítica nasceu por volta do século XVIII, tendo como cenários os salões literários e artísticos. Ela também pontuava em meio a mostras regulares e se desenvolvia paralelamente ao crescimento dos consumidores de arte e da própria mídia. É mais ou menos nessa ocasião que se tenta inicialmente diferenciar com clareza a crítica e a história da arte.
Um campo pertence ao historiador, profissional que se volta para épocas passadas; o outro está ao alcance do crítico de arte, o qual se preocupa em avaliar as obras que lhe são contemporâneas. Apesar de tudo, ainda é difícil fixar fronteiras nítidas entre as duas esferas de atuação, pois ambas estão inevitavelmente entrelaçadas. As reflexões sobre o belo, no campo estético, nutrem tanto as concepções críticas quanto as investigações da história da arte.
Em nosso país o despertar da crítica de arte está vinculado à instituição da Academia Imperial das Belas Artes, a Aiba, no Rio de Janeiro, em 1826. Este evento introduz a aprendizagem do estilo artístico oficial no Brasil. Seu primeiro destaque é o pintor, crítico e historiador de arte Manuel de Araújo Porto-Alegre, o qual esteve à frente da instituição entre 1854 e 1857.
A crítica tem quase sempre um caráter polêmico, e dificilmente alcança a unanimidade. Geralmente o parecer do crítico destoa da opinião formada pelo público, e às vezes cria-se um mal-estar entre esta atividade analítica e a do artista.
Fonte:
A Associação Brasileira dos Críticos de Arte fez este mês, na Fundação Casa de Rui Barbosa, no Flamengo, um seminário internacional para discutir a própria crítica de arte e seus deslocamentos. Apesar de São Paulo (onde fica a sede da instituição) promover encontros regulares, desde 1959 o Rio não reunia seus críticos para discussões desta ordem. Para falar sobre alguns tópicos debatidos, como o papel contemporâneo do crítico de arte, conversamos com a vice-presidente da ABCA, Angela Ancora da Luz.
http://www.artrio.art.br/pt-br/entrevistas/critica-de-arte-hoje
Como você vê a relação da crítica ao longo da história da arte?
Deve-se procurar refletir sobre a relação da crítica com seu objeto ao longo da história da arte, ou seja, que objeto desperta o olhar do crítico? A obra de arte sempre se fez presente diante do olhar de um fruidor. Sua história é a única que tem que ser escrita diante do objeto, e não a partir de um passado. A obra, que inscreve o homem na sua própria humanidade, existe como decorrência do artista e nos ajuda a compreender a nossa historicidade. Então sempre existiu o artista, a obra e o olhar de um crítico que poderia ser de qualquer um que, ao contemplar a produção refletisse sobre ela. Mas a figura do crítico, como hoje se discute, esta surge num tempo mais próximo. É possível que o artista Vasari, no Renascimento, que foi o primeiro a escrever uma História da Arte a partir da vida dos artistas, tenha sido também, o primeiro crítico, e, até mesmo curador, ao montar uma exposição por ocasião das exéquias de Michelângelo, pela seleção e observação que fez junto a outros artistas da época. Mas este discurso crítico só começa a acontecer a partir dos salões de arte na França. A crítica nasce como conseqüência das grandes exposições e dos salões. Diderot, um dos primeiros a escrever sobre o assunto, sonhava com uma publicação que pudesse, não só apresentar as obras expostas, como publicar comentários sobre as mesmas. Durante a segunda metade do século XVIII este procedimento começa a se cristalizar em libretos explicativos que ajudavam a “mostrar” a obra através de avaliações, descrições e narrações da própria obra! Em 1866 Émile Zolà vai afirmar que um salão não era obra de artista, mas de um júri. Coloca na comissão um peso de avaliação valorativa que poderia instaurar a obra como arte e fazer de seu criador o artista. Baudelaire, que é considerado o primeiro crítico no sentido mais próximo do que pensamos hoje, escreveu sobre o salão de 1845, como também sobre o do ano seguinte. Ele discute uma relação entre a necessidade do crítico e a sua utilidade, uma vez que se pergunta se o crítico poderia ensinar alguma coisa ao burguês. Ele defende que a crítica deveria ser poética e divertida e nunca fria e algébrica. Não deveria tentar explicar o que se vê de uma forma racional, pois se o crítico não colocasse amor ou ódio em seu texto não imprimiria sua própria personalidade, afirmando que, talvez, a melhor crítica de um quadro viria a partir de um soneto ou de uma poesia do crítico.
O crítico tem/teve um poder de “sacramentar” o que é/foi relevante?
Isto, realmente, aconteceu e ainda acontece. Muitos críticos promovem artistas que se tornam conhecidos pelos seus textos, muitas vezes antes mesmo de o serem pelas próprias obras. Os interesses é que variam, ou melhor, de onde parte a escolha? Do próprio crítico? Da Imprensa? Do interesse das galerias? Do mercado de arte? Da necessidade de estar trazendo sempre algo novo? São questões que devem ser pensadas para que possamos entender melhor o movimento da crítica.
É preciso ter distanciamento da obra ou envolvimento?
Quanto ao distanciamento ou envolvimento que o crítico deva ou não ter com a obra são pontos discutíveis. Penso que o distanciamento esfria o olhar do crítico e desacelera sua capacidade de encontrar na obra os argumentos de sua própria inquirição. O escultor Roberto Moriconi refletiu sobre o altíssimo risco de se olhar uma obra, porque poderíamos ser introjetados por ela. Eu gosto de pensar assim, pois, como o filósofo Didi-Hubermann confirmou existe “o que vemos” e “o que nos olha” e o crítico tem que se deixar olhar pela obra. Então eu penso que este envolvimento, dentro deste entendimento, é mais salutar, pois vai liberar o crítico de fazer textos meramente laudatórios, pois, ao se expor a este “olhar da obra” poderá criar textos mais autênticos e vividos em sua experiência e conhecimento.
Na sua opinião, qual o papel da crítica hoje? Para mim o papel da crítica hoje é “crítico”. São poucos os que se abrem a obra desinteressadamente. Como já falei, os interesses na promoção de artistas por galerias e marchands deslocam o primeiro movimento do crítico, que deveria ser o da escolha, para fazê-lo passar por um ritual demonstrativo da instigação deste ou daquele artista. Muitas vezes os textos surgem parecidos. É possível se pensar em mudar o objeto do qual se fala e deixar o texto que é monolítico e se mantém independente desta ou daquela obra. Mas, ainda assim, a crítica exerce um papel. Na apresentação em catálogos, colunas de jornal, comunicações em mesas, o crítico é capaz de fazer a sua obra tendo como estímulo a criação do artista do qual ele fala. Isto também é criação.
Quais são os desafios que o crítico encontra? Os grandes desafios que o crítico enfrenta hoje começam com a própria necessidade de clareza de seu texto. Como escrever para um público que não tem a mesma formação? Para uma parte ele deveria escrever um texto de iniciação enquanto para outra, um mais hermético, recheado de termos filosóficos e de questões abstratizantes, mas que não exprimem nem a obra nem o pensamento do próprio crítico! O fruidor da obra não precisa ser um conhecedor da história da arte, nem da filosofia, nem da estética. Ele só tem que ser seduzido pela obra e contemplá-la. Cabe ao crítico discutir o seu próprio olhar para que aquele que se interessa possa encontrar os pontos de afinidade, as fronteiras possíveis entre o “como ele viu” e o “como o crítico vê”. Neste cruzamento ele também surge como crítico, ao se colocar em juízo diante da obra, refletindo sobre sua primeira avaliação e sobre a que lhe foi apresentada pelo crítico. Hoje, no meio acadêmico, temos muitos historiadores, teóricos, curadores e críticos de arte. De um modo geral eles são a mesma pessoa, pois na contemporaneidade se torna muito difícil separar as categorias e individualizar as ações.

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